O Professor do curso de Manejo Reprodutivo em Equinos do CPT Cursos Presenciais, Pedro Gama Ker, Médico Veterinário formado pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), Mestre e doutor em Reprodução Animal pela UFV, foi convidado pela Revista Veterinária para falar sobre a Reprodução em Equinos.
RV – Sabe-se que há duas formas de reprodução em equinos. Uma, a campo, outra, assistida. Em se tratando da segunda, qual a melhor época para se iniciarem os processos e técnicas adequadas a essa fase?
Prof. Pedro – As éguas são animais poliéstricos estacionais de dias longos (maior fotoperíodo), por isso a melhor época para iniciarmos a estação de monta na espécie equina é o período da primavera e verão. No Brasil este período representa uma maior atividade reprodutiva e manifestação de cios durante os meses de Outubro a Março. No início da primavera a duração de luminosidade no dia começa a aumentar, atuando como estimulador do sistema neuroendócrino do animal, desencadeando assim a liberação dos hormônios relacionados com a reprodução e consequentemente a manifestação do cio. Esse período coincide com a época de maiores temperaturas e disponibilidade de alimentos, proporcionando melhores condições para nascimento dos potros.
Existem alguns métodos e biotecnologias aplicadas à reprodução equina. A escolha de qual método a ser utilizado no criatório vai depender dos objetivos a serem alcançados no haras e do investimento do proprietário. O método mais simples é a monta natural controlada, que exige pouco investimento e se bem manejado apresenta bons resultados de fertilidade. Este método consiste em uma rufiação bem feita (ou pode ser feito também palpação transretal e ultrasonografia) e quando a égua é identificada em cio é levada até o garanhão para ser coberta. A égua deve estar bem contida e com a vulva devidamente higienizada para que se proceda a cobertura.
A inseminação artificial (IA) pode ser utilizada em criatórios pequenos, médios e grandes, pois é uma técnica relativamente barata e que garante muitos benefícios. Essa técnica propicia, dentre outras vantagens, a maximização do uso de garanhões geneticamente superiores, pois com a coleta do sêmen, podemos inseminar um maior número de éguas na estação de monta. Na rotina dos haras e criatórios as inseminações são feitas com sêmen fresco ou resfriado. A utilização de sêmen congelado é uma alternativa, pois podemos estocar o sêmen por um período indeterminado, porém os custos são maiores quando comparados ao sêmen fresco e resfriado, e os resultados de fertilidade são inferiores quando comparados ao sêmen fresco e resfriado.
Outra biotécnica que pode ser aplicada à reprodução equina é a transferência de embriões (TE). Essa biotécnica é utilizada quando se deseja obter maior número de potros de éguas superiores. A técnica de TE consiste primeiramente na inseminação da égua doadora e confirmação da ovulação após a IA. Com o auxílio de uma sonda uterina adequada, realiza-se o lavado do útero entre o 7° e 9° após a ovulação. O embrião coletado é transferido para uma receptora, que ovulou sincronicamente com a doadora. Porém para obtenção de resultados satisfatórios deve-se fazer um bom manejo das éguas doadoras e receptoras e, além disso, o médico veterinário deve ser bem capacitado e ter grande habilidade com a técnica.
Outras biotecnologias como fecundação in vitro (FIV), transferências de ovócitos (TO), transferência intrafalopiana de gametas (GIFT), injeção espermática intra-citoplasmática (ICSI) e clonagem podem ser aplicadas à espécie equina, porém estão restritas à grandes centros de reprodução assistida e apresentam custos muito elevados.
RV – Em que idade deve acontecer o primeiro acasalamento das éguas?
Prof. Pedro – A idade à puberdade (primeira manifestação de cio e ovulação) nas éguas ocorre por volta dos 18 aos 24 meses, porém a primeira cobertura deve ocorrer depois dos 2,5 a 3 anos de idade dependendo do tipo de manejo nutricional do haras. Se as potras forem bem nutridas (começando com a nutrição da mãe no período gestacional) elas atingem o tamanho para cobertura antes do que se tivessem sofrido restrição alimentar. Coberturas antes dos 3 anos de idade não são recomendadas, pois caso a potra ficar gestante vai deslocar parte das suas exigências para a gestação e assim prejudicar o crescimento corporal. Além disso, a potra pode não ter o útero com tamanho ideal para receber uma gestação o que pode causar perdas gestacionais. Partos distócicos também podem ocorrer com potras cobertas muito precocemente, principalmente com raças de maior porte.
RV – Quais são as características do cio em éguas? Qual o momento ideal para que aconteça a cobertura para se proceder a cobertura?
Prof. Pedro – A égua em cio apresenta algumas características próprias da espécie que podem ser identificadas pela rufiação e/ou palpação transretal e ultrasonografia. Na rufiação a égua deixa o garanhão se aproximar, levanta a cauda, abaixa a pélvis e abre os membros posteriores, sempre com micção e eversão do clitóris. Pela palpação transretal e ultrasonografia podemos identificar:
– Ovários: folículo grande e macio (pode haver mais de um folículo pré-ovulatório) e ausência de corpo lúteo;
– Útero: textura macia e parede endometrial edemaciada;
– Cérvice: relaxada e com o lúmen aberto (quando examinada pelo espéculo);
– Mucosa da vagina: hiperêmica.
– A duração do cio na égua é de aproximadamente 7 dias com a ovulação podendo acontecer até 24-48 horas antes do final do cio. O tamanho do folículo no início do cio é em média de 30 mm e o folículo pré-ovulatório é de aproximadamente 40-45 mm.
Para saber momento ideal para se proceder a cobertura, devemos levar em consideração a viabilidade do gameta feminino (ovócito) e masculino (espermatozóide). A viabilidade do ovócito é de aproximadamente 12 horas após a ovulação e a viabilidade do espermatozóide é de aproximadamente 48 horas após a ejaculação. Sendo assim, as coberturas devem ser realizadas em dias alternados, a partir do 3° dia do cio (folículo com 35 mm) até a detecção da ovulação ou término dos sinais de estro (cio). Desta maneira quando ocorrer a ovulação, ambos os gametas estarão viáveis para que ocorra a fecundação e desenvolvimento do embrião.
Para realização da cobertura, devemos fazer um esquema de rufiação eficiente para identificarmos com o máximo de precisão possível o início do cio. É importante salientar que para a cobertura a égua deve estar bem contida com peias ou tronco, minimizando as chances de acidentes com o garanhão e com o condutor, e com a vulva devidamente higienizada para diminuir as chances de contaminação no momento da cobertura.
RV – Como se dá o período de gestação de uma égua? Há cuidados especiais durante esse período?
Prof. Pedro – A gestação é o período entre a fecundação do ovócito e o parto. Na égua a duração da gestação é de aproximadamente 330 dias (podendo variar de 315 a 360 dias) e pode ser influenciado por fatores como: tamanho da égua, manejo nutricional da égua, genótipo e sexo do feto (fetos machos podem apresentar períodos gestacionais mais longos).
O diagnóstico pode ser feito por exame ultrasonográfico (a partir de 13 dias após ovulação), por palpação retal (a partir de 18 dias de gestação) e por dosagens hormonais.
Durante a gestação devemos ter alguns cuidados com a égua, principalmente com a nutrição. Cuidados especiais devem ser dedicados às éguas com cria, pois além das exigências da gestação, ocorre um aumento nas necessidades nutricionais devido à lactação.
A água deve ser sempre de boa qualidade e fornecida à vontade. Para prevenir a subnutrição devemos adequar os aportes protéicos, energéticos, minerais e vitamínicos conforme as necessidades do animal. Quando a nutrição é deficiente pode ter redução na fertilidade, perdas embrionárias precoces, abortos, nascimentos prematuros, natimortos e potros fracos e debilitados.
A gestação pode ser dividida em 2 fases:
Primeira fase (1° ao 8° mês):
Nessa fase as necessidades da égua gestante são pouco maiores que às de manutenção. O feto atinge aproximadamente 1/3 do seu tamanho. Um volumoso de boa qualidade, mineralização adequada e suplementação com ração (se necessário) são o suficiente para suprir as necessidades.
Segunda fase (9° mês ao parto):
Neste período ocorre um grande aumento nas necessidades da égua. O feto cresce 2/3 do seu tamanho. Assim a maior parte dos nutrientes é deslocada para o crescimento do potro. A nutrição nesta fase é de suma importância, pois além do crescimento final do potro, a mãe deve se preparar para a lactação. A égua deve produzir colostro de excelente qualidade que garanta uma proteção adequada e uma produção leiteira que propicie um ótimo desenvolvimento inicial do potro. Outro fator importante a ser considerado é a fertilidade do "cio do potro", éguas bem nutridas começam a ciclar mais rápido e concebem com mais facilidade no primeiro cio após o parto.
Outro cuidado a ser tomado com a égua gestante é o manejo sanitário.
A vermifugação das éguas deve seguir o esquema adotado para os outros animais (a cada 60 ou 90 dias), sendo que uma vermifugação 30 dias antes da data prevista para o parto é necessária para evitar que a contaminação do feto por larvas de vermes que atravessam a placenta. O controle dos carrapatos deve ser feito de forma estratégica, sempre atentando para as instruções de uso, forma de aplicação e diluições recomendadas para os produtos utilizados. Antes da utilização de qualquer produto para controle de endo ou ectoparasitas deve-se consultar o médico veterinário para saber se o produto não causará prejuízos à gestação.
As vacinações devem ser feitas para prevenir o aparecimento de doenças no plantel e também para que ocorra formação de anticorpos pela mãe e secreção destes no colostro. O protocolo de vacinações deve ser feito de acordo com a incidência da doença e também com a movimentação de animais na propriedade. Devemos atentar para doenças que causem prejuízos de ordem reprodutiva como herpes vírus e leptospirose.
RV – Existe alguma diferença entre a cobertura feita por um cavalo e um jumento? Isso interfere na duração do período gestacional?
Prof. Pedro – Os asininos e os equinos pertencem à família Equidae, o que faz com que os criadores acreditem que o comportamento reprodutivo das duas espécies sejam os parecidos, adotando o mesmo sistema de manejo reprodutivo. Existem algumas diferenças entre as espécies que devem ser levados em consideração para adoção de um esquema de manejo reprodutivo, principalmente quando se deseja que o jumento cubra éguas. Os jumentos apresentam características de organização social do tipo territorial, diferente dos equinos que apresentam organização em harém. Além disso, os jumentos apresentam alguns comportamentos de cortejo da fêmea em cio diferente dos garanhões, o que pode fazer com que a égua rejeite o jumento, por isso é importante a construção de troncos de contenção adequados para reduzir as chances de acidentes e também diminuir a diferença de estatura do jumento e da égua (que geralmente é maior). Outra consideração importante é que, no período do cio, a égua apresenta características comportamentais diferentes da jumenta, e se o jumento não for condicionado a cobrir éguas ele vai rejeitá-la e pode-se não alcançar o objetivo esperado. Porém quando o jumento é condicionado a cobrir éguas, os resultados de prenhez na estação de monta são similares aos conseguidos com garanhões. Antes da estação de monta, é importante fazer o exame andrológico completo do jumento, por um médico veterinário devidamente treinado. Com esse exame temos uma avaliação da qualidade do sêmen e podemos verificar se o animal está apto à reprodução.
A égua gestante de jumento vai apresentar um tempo de gestação intermediário entre o da égua gestante de cavalo (11 meses) e da jumenta (12 meses), ou seja, 11,5 meses. Porém esse tempo pode variar de 315 a 360 dias e pode ser influenciado por fatores como: tamanho da égua, manejo nutricional da égua e sexo do feto (fetos machosapresentar períodos gestacionais mais longos).
RV – Deixe, aqui, suas considerações finais e esclarecimentos para aqueles que desejarem iniciar ou melhorar a atividade da equinocultura.
Prof. Pedro – O manejo reprodutivo dos equideos é de grande importância para o sucesso e lucratividade do criatório. O técnico que deseja ter sucesso deve apresentar conhecimentos de anatomia, fisiologia, técnicas laboratoriais e medidas de manejo que vão influenciar diretamente nos seus resultados. Cada criatório vai apresentar uma realidade diferente, exigindo do técnico tomadas de decisões corretas para resolução dos problemas e obtenção de índices satisfatórios de prenhez, seja por monta natural a campo, monta controlada, inseminação artificial (com sêmen fresco, resfriado ou congelado) ou transferência de embriões. É relevante investir em formas de aperfeiçoamento e cursos específicos voltados a área da reprodução de equideos para assim se capacitar e entrar no competitivo mercado da criação de cavalos.
RV – A Revista Veterinária agradece a sua gentileza em participar desta entrevista.
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